Teorias, pesquisas e reflexões sobre a gastronomia brasileira, por Quentin Geenen de Saint Maur
quarta-feira, 30 de novembro de 2011
quinta-feira, 24 de novembro de 2011
Brasil brasileiro
Janaina Fidalgo - O Estado de S.Paulo
SAN SEBASTIÁN - Querendo ser local, mas mantendo os "poros abertos para o global", a vanguarda da gastronomia espanhola abriu espaço nesta edição do San Sebastián Gastronomika, encerrada ontem no País Basco, para uma lufada de ar fresco de três "cozinhas emergentes": Brasil, México e Peru.
Divulgação
Brigada cabocla. Entre os integrantes, Claude, Roberta, Rodrigo, Helena. Alex e Thomas: pela primeira vez uma delegação de chefs brasileiros vai unida a um congresso de gastronomia
Foi a primeira vez que uma delegação de chefs brasileiros viajou junta a um congresso de gastronomia. E a estreia coletiva, num momento em que muito se falou sobre a necessidade de haver uma integração mundial entre os cozinheiros, não poderia ter sido mais simbólica. Teve como cenário essa cidade que, ainda que pequena, tem três triestrelados Michelin - Arzak, Akelarre e Martín Berasategui.
"A cozinha brasileira está com uma saúde que nunca teve. É impressionante como subiu em poucos anos e a passos largos", disse Berasategui ao Paladar. "O que o Brasil tem de forte neste momento é o fato de diferentes gerações de cozinheiros estarem vestindo a mesma camisa. Isso faz com que tenha uma das mais importantes cozinhas do mundo."
Citando o exemplo da cozinha espanhola, Pedro Subijana, do Akelarre, disse que o reconhecimento e a repercussão da gastronomia de um país é resultado de trabalho duro e insistência. "Durante anos ninguém nos deu respaldo, nem as instituições nem ninguém. Tínhamos objetivos bem definidos. Mas só depois que nos valorizaram fora foi que os de casa nos reconheceram."
Se depender da atenção que o Brasil conquistou nesta edição, ao menos dos chefs espanhóis que ocuparam a primeira fileira do Palácio Kursaal, parte do caminho está trilhado. Coube aos brasileiros a abertura do Gastronomika, na última segunda-feira - bem, na verdade, a um francês, ainda que brasileiríssimo.
Apontado por Alex Atala como um dos precursores do que hoje se entende por cozinha brasileira, Claude Troisgros passeou, junto do filho, Thomas, por criações marcantes em sua carreira, como o caviar de tapioca.
Helena Rizzo levou seus exercícios de fruição, expressos numa poesia escrita por ela e nas experiências com a araruta - ingrediente de cultura quase abandonada que chegou ao cardápio do Maní por vias tortuosas, depois de uma viagem ao Japão. Num vídeo com cenas rurais intercaladas a outras gravadas no restaurante, Helena apresentou um produtor baiano de araruta, seu Pedro Cone, e compartilhou a dificuldade de conseguir licuri fresco, "o coquinho de vida curta que, logo depois de colhido, fica rançoso".
Na apresentação seguinte, Rodrigo Oliveira recorreu a uma combinação infalível para teletransportar o público ao Mocotó: uma dose de cachaça e o crec-crec do torresmo, uma "língua universal". Compartilhou a maneira como aprimorou a técnica de preparo do torresmo, alertou para o desaparecimento da cozinha dos cozidos e brincou ao associar uma das técnicas da cozinha tecnoemocional, a esferificação, à perfeição da fava. "É uma cápsula de purê. Já nasce esferificada."
A ênfase no produto e no produtor foi a tônica da aula de Roberta Sudbrack. Conhecida por eleger a cada ano um ingrediente de estudo, falou do milho plantado por d. Virgínia: "Meu mise en place começa no quintal dos produtores". Com ele, fez um curau servido com pele de banana.
Último brasileiro a se apresentar, Alex Atala adotou um tom mais político ao lamentar a falta de apoio do governo na divulgação da gastronomia brasileira. Questionou o que é inovação na cozinha, ao defender a criatividade quando ela tem utilidade, e disse que, se ainda há sabores a serem descobertos, eles estão na América Latina. "Somos a maior despensa de produtos a serem revelados. Sem exagero, podemos afirmar que o futuro da gastronomia passa pela Amazônia e pelo Cerrado", disse Atala.
SAN SEBASTIÁN - Querendo ser local, mas mantendo os "poros abertos para o global", a vanguarda da gastronomia espanhola abriu espaço nesta edição do San Sebastián Gastronomika, encerrada ontem no País Basco, para uma lufada de ar fresco de três "cozinhas emergentes": Brasil, México e Peru.
Divulgação
Brigada cabocla. Entre os integrantes, Claude, Roberta, Rodrigo, Helena. Alex e Thomas: pela primeira vez uma delegação de chefs brasileiros vai unida a um congresso de gastronomia
Foi a primeira vez que uma delegação de chefs brasileiros viajou junta a um congresso de gastronomia. E a estreia coletiva, num momento em que muito se falou sobre a necessidade de haver uma integração mundial entre os cozinheiros, não poderia ter sido mais simbólica. Teve como cenário essa cidade que, ainda que pequena, tem três triestrelados Michelin - Arzak, Akelarre e Martín Berasategui.
"A cozinha brasileira está com uma saúde que nunca teve. É impressionante como subiu em poucos anos e a passos largos", disse Berasategui ao Paladar. "O que o Brasil tem de forte neste momento é o fato de diferentes gerações de cozinheiros estarem vestindo a mesma camisa. Isso faz com que tenha uma das mais importantes cozinhas do mundo."
Citando o exemplo da cozinha espanhola, Pedro Subijana, do Akelarre, disse que o reconhecimento e a repercussão da gastronomia de um país é resultado de trabalho duro e insistência. "Durante anos ninguém nos deu respaldo, nem as instituições nem ninguém. Tínhamos objetivos bem definidos. Mas só depois que nos valorizaram fora foi que os de casa nos reconheceram."
Se depender da atenção que o Brasil conquistou nesta edição, ao menos dos chefs espanhóis que ocuparam a primeira fileira do Palácio Kursaal, parte do caminho está trilhado. Coube aos brasileiros a abertura do Gastronomika, na última segunda-feira - bem, na verdade, a um francês, ainda que brasileiríssimo.
Apontado por Alex Atala como um dos precursores do que hoje se entende por cozinha brasileira, Claude Troisgros passeou, junto do filho, Thomas, por criações marcantes em sua carreira, como o caviar de tapioca.
Helena Rizzo levou seus exercícios de fruição, expressos numa poesia escrita por ela e nas experiências com a araruta - ingrediente de cultura quase abandonada que chegou ao cardápio do Maní por vias tortuosas, depois de uma viagem ao Japão. Num vídeo com cenas rurais intercaladas a outras gravadas no restaurante, Helena apresentou um produtor baiano de araruta, seu Pedro Cone, e compartilhou a dificuldade de conseguir licuri fresco, "o coquinho de vida curta que, logo depois de colhido, fica rançoso".
Na apresentação seguinte, Rodrigo Oliveira recorreu a uma combinação infalível para teletransportar o público ao Mocotó: uma dose de cachaça e o crec-crec do torresmo, uma "língua universal". Compartilhou a maneira como aprimorou a técnica de preparo do torresmo, alertou para o desaparecimento da cozinha dos cozidos e brincou ao associar uma das técnicas da cozinha tecnoemocional, a esferificação, à perfeição da fava. "É uma cápsula de purê. Já nasce esferificada."
A ênfase no produto e no produtor foi a tônica da aula de Roberta Sudbrack. Conhecida por eleger a cada ano um ingrediente de estudo, falou do milho plantado por d. Virgínia: "Meu mise en place começa no quintal dos produtores". Com ele, fez um curau servido com pele de banana.
Último brasileiro a se apresentar, Alex Atala adotou um tom mais político ao lamentar a falta de apoio do governo na divulgação da gastronomia brasileira. Questionou o que é inovação na cozinha, ao defender a criatividade quando ela tem utilidade, e disse que, se ainda há sabores a serem descobertos, eles estão na América Latina. "Somos a maior despensa de produtos a serem revelados. Sem exagero, podemos afirmar que o futuro da gastronomia passa pela Amazônia e pelo Cerrado", disse Atala.
domingo, 6 de novembro de 2011
ONGs do bem e ONGs do mal. Prq?
Fernando Henrique Cardoso - O Estado de S.Paulo
O novo ministro do Esporte, Aldo Rebelo, afirmou recentemente que os desmandos que ocorreram em sua pasta se devem a que as ONGs passaram a ter maior participação na concretização de políticas públicas. E sentenciou: ele só fará convênios com prefeituras, não mais com segmentos da sociedade civil. Ou seja, em vez de destrinchar o que ocorre na administração federal e de analisar as bases reais do poder e da corrupção, encontra um bode expiatório fora do governo.
No caso, quanto eu saiba, é opinião de pessoa que não tem as mãos sujas por desvios de recursos públicos. Não se trata, portanto, de simples cortina de fumaça para obscurecer práticas corruptas. São palavras que expressam a visão de mundo do novo ministro: o que pertence ao "Estado", ao governo, é correto; o que vem de fora, da sociedade, traz impurezas... O mal estaria nas ONGs em si, não no desvio de suas funções nem na falta de fiscalização, cuja responsabilidade é dos partidos e dos governos.
Esse tipo de ideologia vem associado a outra perversão corrente: fora do partido e do governo nada é ético; já o que se faz dentro do governo para beneficiar o partido encontra justificativa e se torna ético por definição.
Repete-se algo do mensalão. Naquele episódio, já estava presente a ideologia que santifica o Estado e faz de conta que não vê o desvio de dinheiro público, desde que seja para ajudar os partidos "populares" a se manterem no poder. Com uma diferença: no mensalão desviavam-se recursos públicos e de empresas para pagar gastos eleitorais e para obter apoio de alguns políticos. Agora são os partidos que se aninham em ministérios e, mesmo fora das eleições, constroem redes de arrecadação por onde passam recursos públicos que abastecem suas caixas e os bolsos de alguns dirigentes, militantes e cúmplices.
A corrupção e, mais do que ela, o "fisiologismo", o clientelismo tradicional, sempre existiram. Depois da redemocratização, começando nas prefeituras, o PT - e não só ele - enveredou pelo caminho de buscar recursos para o partido nas empresas de coleta de lixo e de transporte público (sem ONGs no meio...). Há, entretanto, uma diferença essencial na comparação com o que se vê hoje na esfera federal. Antes o desvio de recursos roçava o poder, mas não era condição para o seu exercício. Agora os partidos exigem ministérios e postos administrativos para obterem recursos que permitam sua expansão, atraindo militantes e apoios com as benesses que extraem do Estado. É sob essa condição que dão votos ao governo no Congresso. O que era episódico se tornou um "sistema", o que era desvio individual de conduta se tornou prática aceita para garantir a "governabilidade".
Dessa forma, as "bases" dos governos resultam mais da composição de interesses materiais que da convergência de opiniões. Com isso perdem sentido as distinções programáticas, para não falar nas ideológicas: tanto faz que o partido se diga "de esquerda", como o PC do B, ou centrista, como o PMDB, ou de centro-direita, como o PR, ou que epíteto tenham, todos são condôminos do Estado. Há apenas dois lados, o dos condôminos e o dos que estão fora da partilha do saque. O antigo lema "é dando que se recebe", popularizado pelo deputado Cardoso Alves no governo Sarney, referia-se às nomeações, ao apadrinhamento, que, eventualmente, poderiam levar à corrupção, mas em si mesmo não o eram. Tratava-se da forma tradicional, clientelista, de fazer política.
Hoje é diferente. Além da forma tradicional - que continua a existir -, há uma nova maneira "legitimada" de garantir apoios: a doação quase explícita de ministérios com as "porteiras fechadas" aos partidos sócios do poder. Digo "legitimada" porque desde o mensalão o próprio presidente Lula outra coisa não fez senão justificar esse "sistema", como ainda agora, no caso da demissão dos ministros acusados de corrupção, aos quais pediu que tivessem "casca dura" - ou queria dizer caradura? - e se mantivessem no cargo. Num clima de bonança econômica, a aceitação tácita deste estado de coisas por um líder popular ajuda a transformar o desvio em norma mais ou menos aceita pela sociedade.
Pois bem, parece-me grave que, no momento em que a presidenta esboça uma reação a esse lavar de mãos, um ministro reitere a velha cantilena: a contaminação adveio das ONGs. Esqueceu que o governo tem a responsabilidade primordial de cuidar da moral do Estado. Não há Estado que seja por si só moral, nem partido que seja imune à corrupção pela graça divina. Pior, que não se possa tornar cúmplice de um sistema que se baseie na corrupção.
O "sistema" reage a essa argumentação dizendo tratar-se de "moralismo udenista", referência às críticas que a UDN fazia aos governos do passado, como se ao povo não interessasse a moral republicana. Ledo engano. É só discutir o tema relacionando-o, por exemplo, com trapalhadas com a Copa para ver se o povo reage ou não aos desmandos e à corrupção. A alegação antimoralista faz parte da mesma toada de "legitimação" dos "malfeitos". Não me parece que a anunciada faxina, embora longe de haver sido completa, tenha tirado apoios populares da presidenta. O obstáculo a uma eventual faxina não é a falta de apoio popular, mas a resistência do "sistema", como se viu na troca de um ministro por outro do mesmo partido, possivelmente também para preservar um ex-titular do mesmo ministério que trocou o PC do B pelo PT e hoje governa o Distrito Federal. Estamos diante de um sistema político que começa a ter a corrupção como esteio, mais do que simplesmente diante de pessoas corruptas.
Ainda há tempo para reagir. Mas é preciso ir mais longe e mais rápido na correção de rumos. E nesse esforço as oposições não se devem omitir. Podem lutar no Congresso por uma lei, por exemplo, que limite o número de ministérios e outra, se não a mesma, que restrinja ao máximo as nomeações fora dos quadros de funcionários. Por que não explicitar as condições para que as ONGs se tornem aptas a receber dinheiros públicos? Os desmandos não se restringem ao Ministério do Esporte, há outros na fila. Os dossiês da mídia devem estar repletos de denúncias. Não adianta dizer que se trata de "conspirações" contra os interesses populares. É da salvaguarda deles que se trata.
SOCIÓLOGO, FOI PRESIDENTE DA REPÚBLICA
O novo ministro do Esporte, Aldo Rebelo, afirmou recentemente que os desmandos que ocorreram em sua pasta se devem a que as ONGs passaram a ter maior participação na concretização de políticas públicas. E sentenciou: ele só fará convênios com prefeituras, não mais com segmentos da sociedade civil. Ou seja, em vez de destrinchar o que ocorre na administração federal e de analisar as bases reais do poder e da corrupção, encontra um bode expiatório fora do governo.
No caso, quanto eu saiba, é opinião de pessoa que não tem as mãos sujas por desvios de recursos públicos. Não se trata, portanto, de simples cortina de fumaça para obscurecer práticas corruptas. São palavras que expressam a visão de mundo do novo ministro: o que pertence ao "Estado", ao governo, é correto; o que vem de fora, da sociedade, traz impurezas... O mal estaria nas ONGs em si, não no desvio de suas funções nem na falta de fiscalização, cuja responsabilidade é dos partidos e dos governos.
Esse tipo de ideologia vem associado a outra perversão corrente: fora do partido e do governo nada é ético; já o que se faz dentro do governo para beneficiar o partido encontra justificativa e se torna ético por definição.
Repete-se algo do mensalão. Naquele episódio, já estava presente a ideologia que santifica o Estado e faz de conta que não vê o desvio de dinheiro público, desde que seja para ajudar os partidos "populares" a se manterem no poder. Com uma diferença: no mensalão desviavam-se recursos públicos e de empresas para pagar gastos eleitorais e para obter apoio de alguns políticos. Agora são os partidos que se aninham em ministérios e, mesmo fora das eleições, constroem redes de arrecadação por onde passam recursos públicos que abastecem suas caixas e os bolsos de alguns dirigentes, militantes e cúmplices.
A corrupção e, mais do que ela, o "fisiologismo", o clientelismo tradicional, sempre existiram. Depois da redemocratização, começando nas prefeituras, o PT - e não só ele - enveredou pelo caminho de buscar recursos para o partido nas empresas de coleta de lixo e de transporte público (sem ONGs no meio...). Há, entretanto, uma diferença essencial na comparação com o que se vê hoje na esfera federal. Antes o desvio de recursos roçava o poder, mas não era condição para o seu exercício. Agora os partidos exigem ministérios e postos administrativos para obterem recursos que permitam sua expansão, atraindo militantes e apoios com as benesses que extraem do Estado. É sob essa condição que dão votos ao governo no Congresso. O que era episódico se tornou um "sistema", o que era desvio individual de conduta se tornou prática aceita para garantir a "governabilidade".
Dessa forma, as "bases" dos governos resultam mais da composição de interesses materiais que da convergência de opiniões. Com isso perdem sentido as distinções programáticas, para não falar nas ideológicas: tanto faz que o partido se diga "de esquerda", como o PC do B, ou centrista, como o PMDB, ou de centro-direita, como o PR, ou que epíteto tenham, todos são condôminos do Estado. Há apenas dois lados, o dos condôminos e o dos que estão fora da partilha do saque. O antigo lema "é dando que se recebe", popularizado pelo deputado Cardoso Alves no governo Sarney, referia-se às nomeações, ao apadrinhamento, que, eventualmente, poderiam levar à corrupção, mas em si mesmo não o eram. Tratava-se da forma tradicional, clientelista, de fazer política.
Hoje é diferente. Além da forma tradicional - que continua a existir -, há uma nova maneira "legitimada" de garantir apoios: a doação quase explícita de ministérios com as "porteiras fechadas" aos partidos sócios do poder. Digo "legitimada" porque desde o mensalão o próprio presidente Lula outra coisa não fez senão justificar esse "sistema", como ainda agora, no caso da demissão dos ministros acusados de corrupção, aos quais pediu que tivessem "casca dura" - ou queria dizer caradura? - e se mantivessem no cargo. Num clima de bonança econômica, a aceitação tácita deste estado de coisas por um líder popular ajuda a transformar o desvio em norma mais ou menos aceita pela sociedade.
Pois bem, parece-me grave que, no momento em que a presidenta esboça uma reação a esse lavar de mãos, um ministro reitere a velha cantilena: a contaminação adveio das ONGs. Esqueceu que o governo tem a responsabilidade primordial de cuidar da moral do Estado. Não há Estado que seja por si só moral, nem partido que seja imune à corrupção pela graça divina. Pior, que não se possa tornar cúmplice de um sistema que se baseie na corrupção.
O "sistema" reage a essa argumentação dizendo tratar-se de "moralismo udenista", referência às críticas que a UDN fazia aos governos do passado, como se ao povo não interessasse a moral republicana. Ledo engano. É só discutir o tema relacionando-o, por exemplo, com trapalhadas com a Copa para ver se o povo reage ou não aos desmandos e à corrupção. A alegação antimoralista faz parte da mesma toada de "legitimação" dos "malfeitos". Não me parece que a anunciada faxina, embora longe de haver sido completa, tenha tirado apoios populares da presidenta. O obstáculo a uma eventual faxina não é a falta de apoio popular, mas a resistência do "sistema", como se viu na troca de um ministro por outro do mesmo partido, possivelmente também para preservar um ex-titular do mesmo ministério que trocou o PC do B pelo PT e hoje governa o Distrito Federal. Estamos diante de um sistema político que começa a ter a corrupção como esteio, mais do que simplesmente diante de pessoas corruptas.
Ainda há tempo para reagir. Mas é preciso ir mais longe e mais rápido na correção de rumos. E nesse esforço as oposições não se devem omitir. Podem lutar no Congresso por uma lei, por exemplo, que limite o número de ministérios e outra, se não a mesma, que restrinja ao máximo as nomeações fora dos quadros de funcionários. Por que não explicitar as condições para que as ONGs se tornem aptas a receber dinheiros públicos? Os desmandos não se restringem ao Ministério do Esporte, há outros na fila. Os dossiês da mídia devem estar repletos de denúncias. Não adianta dizer que se trata de "conspirações" contra os interesses populares. É da salvaguarda deles que se trata.
SOCIÓLOGO, FOI PRESIDENTE DA REPÚBLICA
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