Eu não fui às passeatas,
mas assisti empolgada e fui contaminada por elas, fui inspirada por sua brisa
alegre e fortalecida por sua força moral. Me senti mais viva, e de algum jeito
mais confirmada no que penso, me senti esperançada. Parecia que tudo tinha sido
zerado e de novo cada pessoa podia se re-posicionar com todo alcance da sua
vontade e o discernimento de sua postura moral. Ninguém realmente sabe onde
vamos, o que podemos alcançar, isso será decidido entre nós, pelo que queremos
viver e apostar juntos. Não é mais hora de esperar por salvadores, gurus ou
governos para virem solucionar todos nossos problemas, está em nossas mãos
opinar e participar das decisões sobre meu local, trazer o governo para a
praça, para a Polis – e melhor ainda trazer para a Ágora, aquela interface
entre a cozinha e o mercado, característica da Grécia antiga, onde aconteciam
as trocas, as conversas, as regulamentações, acertadas entre com(pão)nheiros,
aqueles que comem o pão juntos, que são os mesmos que vão sofrer as consequências
do que será decidido. Voltar ao LUGAR – ama-lo como nativo, defende-lo como
residente, cuidá-lo com todo engenho e sabedoria e reverenciá-lo com um sonho
consequência.
Sinto que o Brasil deveria
“fechar para balanço” e cada um fazer uma revisão de vida, de objetivos e se
re-posicionar numa nova ordem coletiva, nesse
processo evolucionário da consciência; em cada grupo a que pertenço
tenho vontade de rever os princípios, refinar o sonho e re-direcionar
o propósito comum; pois é um momento onde tudo se torna mais
possível. No limiar de uma nova civilização estamos entendendo mais claramente
que nossa intenção, nosso sonho, nosso desejo transforma o futuro, estamos
aprendendo a melhor intencionar o futuro conjunta mente.
A que tipo de coletivo
queremos pertencer?
Penso que podemos nos
espelhar na sabedoria ancestral da natureza onde cada célula, cada bactéria,
cada ser, cada sistema e até mesmo o planeta se auto regulam, se auto governam;
por muito tempo, temos relegado a outros nossas decisões e nosso destino. É
ilusão achar que o governo vai ser diferente e achar soluções mais harmônicas,
pois o governo é essencialmente adversarial, partidário, fiscalizador, não tem
intenção de ser solidário, integrador... porque somos governados, abdicamos da
tarefa de entender e decidir. O lugar não precisa de domínio, precisa de
cuidados, amor, presença, suor, alegria... Certamente, devemos achar a medida
certa que necessitamos de regulamentação global, que facilite a comunicação e
inter-relacionamento entre as culturas mas as soluções integradoras deverão ser
achadas momento a momento em cada local por aqueles que implementam e sofrem as
consequências das decisões; um equilíbrio entre auto-regulação e cooperação
numa ordem global que beneficie a todos.
Somos todos aprendizes
na tarefa de viver, o estado critico atual de nossa civilização demanda um
salto quântico de consciência se quisermos sobreviver e alcançar todo nosso
potencial. A natureza é bela, surpreendente, complexa, inclusiva, interligada,
regenerativa, se transforma a cada momento, sem deixar resíduos danosos, com
baixo custo, aproveitando com graça e economia tudo que chega do sol, e do
cosmos, para se transformar em água, abrigo, alimento, calor, iluminação,
divertimento. Precisamos tornar nossos cérebros mais parecidos com ela. Já
sabemos muito sobre as partes individuais. Nosso corpo é uma comunidade, tem 50
trilhões de células (todos cidadãos numa tremenda cooperação). Agora
precisamos urgentemente desenvolver o outro hemisfério cerebral, que vê
as relações entre as partes, aprecia o Todo, é mais simbólico e menos linear; é
poético e se apoia também na emoção para encontrar soluções mais
harmônicas e belas, na escala e ritmo certos apropriados para o local, para as
pessoas e todos os seres desse lugar. O masculino se apoia no comando e
controle, é mais focado na ação, se orienta pela analise das partes, é mais
competitivo e hierárquico; o feminino (até agora menos desenvolvido) é mais
solidário, mais holístico, mais ligado na emoção e apreende por inspeção do
todo. A mente que irá achar novas soluções deve equilibrar os dois hemisférios
cerebrais e aprender a usar o enorme poder do circulo que é a base do saber
sistêmico que permite perceber as partes influenciando o todo ao mesmo tempo em
que o todo está influenciando as partes; a grande magia de uma estrutura não
hierárquica com um centro vazio, esse espaço sagrado onde todas as visões podem
se encontrar.
Quero fazer,
mostrar e incentivar a arte, apostar no seu grande poder transformador, na sua
capacidade de gerar conhecimento de proporcionar um entendimento sentido,
isto é, incorporado pelos sentidos Acredito que a questão mais urgente é
trabalhar a nossa transformação humana, e a arte é um veiculo poderoso para a
transformação, em parte porque não é confrontacional, arte é sobre
beleza e transparência. Penso que será através da arte em todas suas formas que
iremos enriquecer o imaginário coletivo, cultivando a curiosidade para
apreender outras formas de entender o mundo que aumentam nossa percepção e recriam
um sonho mais complexo e integrador. E será através do ritual compartilhado em
círculos, que poderemos reforçar nosso desejo, o impulso voluntário que nos
mobiliza para ação.
Nós nos
desenvolvemos no espelho de companheiros que são nosso grupo de referencia,
cada pessoa deve se recolocar no seu grupo, onde compartilha a mesma visão, com
aqueles que estão no mesmo caminho de aperfeiçoamento. Com a sensação de
inclusão e pertencimento a um grupo talvez possamos vencer o medo antológico da
existência, que moldou a nossa civilização; acreditar que podemos fazer
diferente, apostar num design ecológico mais inteligente; alimentar uma
imaginação visionaria e uma intenção disciplinada; nos permitir arriscar sem
garantias, com toda nossa energia e conhecimento do momento e... oferecendo
voluntariamente um esforço extra pela beleza (é meu lema)!
“O coletivo
funciona num nível superior às capacidades dos indivíduos que o compõem.
O indivíduo participa da genialidade do coletivo e por essa
participação se torna também parte dessa genialidade – algo maior que ele mesmo
– sua exaltação resulta de sua participação, não a precede nem a força. O
milagre é em certo sentido interior. É o sujeito que é transformado pelo ritual
e para ele, portanto o mundo se transforma de acordo”, palavras sabias da
antropóloga Maya Deren.
Antes de criar as inovações
precisamos criar os inovadores; criar um ambiente certo, uma cultura certa para
inspirar as pessoas e potencializar sua mentes a atingir todo seu potencial.
Como verdadeira ambientalista, acredito que o ambiente físico, o clima mental,
a disposição psicológica e a vontade podem ser determinantes para o resultado
de qualquer encontro. Toda educação é educação ambiental. Através do
que é incluído ou excluído, aprendemos se somos parte ou estamos à parte do
mundo natural. A finalidade da educação não é mestria numa matéria, mas mestria
sobre a própria pessoa. O assunto-matéria é apenas a ferramenta.
Eu me
comprometo e gostaria de ajudar a criar espaços de aprendizagem e fruição, em
encontros coletivos, unindo o recreio e o ritual, a liberdade e o solene para
refinar a visão e seduzir o futuro a ser como imaginamos. Como Idries Shah, (Perfume
Scorpion), o mestre sufi, acredito que: “Você deve conceber possibilidades
além do seu estado atual se quiser ser capaz de achar as capacidades para
alcançá-las”.
E como David
Orr, (The Nature of Design), mestre do design ecológico, acredito que:
“Somos movidos a agir mais frequentemente, mais consistentemente e mais
profundamente pela experiência da beleza em todas suas formas, do que por
argumentos intelectuais, apelos abstratos ao dever, ou mesmo por medo”.
Quantidades nos contam sobre propriedades das partes; qualidades nos contam
sobre condições do todo. Buscamos refinar nossa percepção da beleza como
referencia de escala e ritmo para ajudar na busca de soluções justas.
Meu objetivo nesta reserva ecológica onde moro, meu
ninho de segurança, meu palco de atuação, minha oficina da imaginação e meu
templo de celebração, é facilitar o refinamento da nossa percepção através da
Beleza, nos ajudar a descobrir um sentido profundo através do dialogo em
círculos de encontro, para que possamos elevar nosso sonho coletivo e talvez
expressar junto uma visão mais significativa para o mundo atual que possa impulsionar
nossas ações a fazer a coisa certa. Aumentar a fascinação sobre o que
podemos fazer junto se re-encantarmos nossos sonhos para produzir uma sabedoria
que ninguém em particular pode saber, mas pode somente acontecer no seio de um
grupo, que se reúne ritualisticamente na tarefa de conhecer a si mesmo e
fertilizar nosso sonho de humanidade.