Por Rafael Tonon
Especial para o Estado
Comprar orgânicos era, até pouco tempo atrás, empreendimento que
exigia acordar cedo para ir à feira de adeptos da prática de não usar
pesticidas e outros reguladores sintéticos da produção. O cenário mudou.
Hoje não é preciso sair da rota convencional: os orgânicos estão até
nas redes de supermercado.
Reflexo da profissionalização da cadeia produtiva e do amadurecimento
do consumidor, a oferta cresce de maneira consistente. Segundo o
Sebrae, a produção aumentou 20% por ano desde 2010. O mercado deve
crescer 35% neste ano, conforme as projeções do Organics Brasil.
FOTO: Fernando Sciarra/Estadão
E o cenário atual já oferece a possibilidade de você escolher o
quanto orgânico você quer ser, como consumidor. Você pode ser mais ou
menos comprometido com a causa, mais ou menos orgânico. Do extremo mais
cômodo – no supermercado, entre um produto de limpeza e um cereal
matinal, comprar tomates livres de agrotóxico – à ponta mais enraizada,
que trava contato direto com o agricultor, há uma escala de envolvimento
que esquadrinhamos nesta reportagem – com prós, contras e como fazer.
“O consumo de orgânicos carrega uma reconexão com o ingrediente”, diz
a professora Maria Ângela Fagnani, da Faculdade de Engenharia Agrícola
(Feagri) da Unicamp. O consumidor quer conhecer onde, em que época e por
quem cada alimento é cultivado, num comportamento que, com tempero
ativista, já tem nome: progressismo culinário.
Esse cenário fez surgir coletivos que buscam produtores locais
dispostos a vender direto ao consumidor, sem mediadores, estreitando os
laços entre o campo e a cozinha de casa.
São dois tipos principais: os grupos de consumo responsável (GCR),
que firmam acordos com produtores para comprar coletivamente; e os
grupos de agricultura sustentada pela comunidade (CSA na sigla em
inglês), em que membros e produtores são sócios, dividem custos e
produção.
1. SUPERMERCADOS
Você vai ao supermercado de sempre e em vez pegar tomate
convencional, pega o orgânico. É a compra que exige menos envolvimento
com a cadeia do orgânico. O conforto tem preço: paga-se mais. “Nos
supermercados, os orgânicos são em média 200% mais caros que os não
orgânicos”, diz Edimar Paulo Santos, que, na pesquisa de mestrado na
Feagri-Unicamp, pesquisou a oferta de orgânicos em dez supermercados da
região de Campinas, Jundiaí e Cabreúva. “Isso acaba fortalecendo a
impressão de que custam absurdamente mais em qualquer lugar”, diz.
Santos acrescenta que, nos supermercados pesquisados, os orgânicos estão
perto de queijos e vinhos caros.
Na rede Pão de Açúcar, que tem seção de orgânicos em todas as lojas, o
grupo projeta alta de 40% nas vendas desses produtos neste ano em
comparação com o ano passado. A abertura de mercados especializados,
como o SuperNatural, inaugurado no final de 2013 nos Jardins, reforça a
tendência. “Na Alemanha o consumo de orgânicos é de 20% do varejo, aqui
no Brasil é 0,1%. É uma realidade nova e um terreno fértil”, diz Ana
Barini, uma das sócias da loja e do Apanã, em Perdizes.
Vantagem: comodidade.
Desvantagens: preço. Eles podem ser 600% mais altos que os dos equivalentes convencionais (o tomate, por exemplo).
Onde: SuperNatural, Rua Augusta, n° 2.992, Jardins. Tel: 3181-7808
2. FEIRAS
Feira de orgânicos no Ibirapuera. FOTO: Divulgação
Ir à feira de orgânicos é dar um passo. É preciso se programar, saber
aonde e quando ir. Por outro lado, as vantagens são muitas: oferta
maior, preço menor, contato com o produtor.
Em Curitiba há feiras diárias. No Rio, são 18 feiras. Em São Paulo,
só oito. Para piorar, a feira do Modelódromo do Ibirapuera tem
permanência garantida no parque só até agosto. “Estamos negociando para
continuar lá e aumentar a presença em mais bairros”, diz Márcio
Stanziani, secretário executivo da Associação de Agricultura Orgânica
(AAO).
Fernando Oliveira, d’A Queijaria, promove, há três meses, uma feira
com 40 produtores, às quintas, na Rua Girassol, na Vila Madalena. “São
mais de 250 produtos à venda, entre hortifrúti, queijos, pescado e até
méis”, afirma Oliveira, que também vende orgânicos pelo site Alimento
Sustentável. Ele diz que a ideia é levar a feira a outras regiões da
cidade. “As feiras são uma forma de ter contato com o produtor.”
Vantagem: preço e oferta. Nas feiras, é possível
encontrar produtos que vão muito além de vegetais (de grãos a leite, de
queijos a geleias), comparar preços e pechinchar.
Desvantagens: localização. Em algumas cidades, como São
Paulo, elas são restritas a alguns bairros ou regiões, o que torna o
acesso mais difícil.
Onde
Feira da Água Branca, Ter. sáb. e dom. Av. Francisco Matarazzo, 455
Feira do Modelódromo, sáb., Rua Curitiba, 292
Feira d’A Queijaria, quinta (exceto feriados). Rua Girassol, nº 591
Mapa no site do Idec:
www.idec.org.br/feirasorganicas
3. CESTAS
FOTO: Fernando Sciarra/Estadão
Ao assinar uma cesta de orgânicos você está dizendo ao produtor que
ele pode produzir aquele alimento. É um compromisso que ajuda a
organizar a vida de quem está na ponta de lá dessa relação de consumo.
Para a ponta de cá, a vantagem é a facilidade: na periodicidade que você
optar, a cesta chega em casa, com o que tem de bom na semana. Ao
escolher a cesta, o consumidor opta por um tamanho (por exemplo, a média
pode ter dois maços de folhas, meio quilo de uma fruta, meio quilo de
um legume, um maço de tempero e um pote de conserva, que pode ser
geleia, molho, picles, etc) e uma periodicidade (toda semana, a cada 15
dias).
Há também modelos mais abertos, como o da Sol e Terra Orgânicos, que
atende 50 famílias. Semanalmente, chega aos clientes a relação de
produtos. Eles escolhem o que querem. “Por se tratar de orgânicos,
atualizamos toda semana porque os produtos estão sujeitos aos fatores de
clima”, diz Laudina Pupin, proprietária da empresa. O pedido mínimo é
de R$ 60 (mais taxa de entrega de R$ 10).
Vantagem: receber os produtos sem sair de casa. Na maioria das vezes, eles já vêm pré-lavados, prontos para o uso.
Desvantagens: o preço. Além dos próprios produtos serem mais caros, há a taxa de entrega.
Preço: De R$ 35 a R$ 60
Onde
www.levebemdelivery.com.br
www.familiaorganica.com.br
www.santaadelaide.org
4. GRUPOS DE CONSUMO RESPONSÁVEL
São formados por pessoas que se reúnem para negociar diretamente com
pequenos produtores. Em linhas gerais, em vez de comprar uma cesta
organizada por alguém, você e seus associados organizam a sua própria
cesta. As compras são coletivas. Para o produtor é ótimo: ele sabe que
vai vender aquele volume todo mês. Para o comprador, é garantia de saber
exatamente a procedência do alimento.
Normalmente, paga-se uma taxa de adesão. Depois, por e-mail, o
associado recebe a lista dos produtos disponíveis na semana e escolhe
quanto quer de cada um dos itens.
Na semana seguinte, os produtores levam os alimentos escolhidos para
um lugar combinado com o grupo e separam ali os pedidos. O associado
precisa ir até este local retirar a compra. “É uma forma de tornar a
compra algo não passivo e uma oportunidade de o associado conhecer o
produtor”, diz Juliana Rodrigues Gonçalves, assessora de projetos do
Instituto Kairós, que mapeia grupos.
Segundo levantamento da instituição feito em agosto de 2013, há cerca
de 20 grupos pelo Brasil. Dois deles atuam em São Paulo: o
ComerAtivaMente e o MICC – Associação de Integração Campo Cidade.
Vantagens: saber exatamente a origem do alimento. A compra sem intermediários é garantia de produtos frescos e mais baratos.
Desvantagem: exige envolvimento do consumidor.
Onde: é possível entrar em um grupo já existente ou criar um. No site do Kairós
institutokairos.net) há mapa e uma cartilha com instruções.
FOTO: Fernando Sciarra/Estadão
5. AGRICULTURA SUSTENTADA PELA COMUNIDADE
O produtor oferece ações de sua fazenda e o consumidor vira sócio
investidor com direito a uma parte do que é produzido ali – quase sempre
materializado na forma de uma cesta semanal. O grupo de consumidores
divide os custos do produtor, que usa a propriedade para cultivar
exclusivamente para esses consumidores.
Surgido no Japão na década de 1960, o sistema ganhou força nos
últimos dez anos. Nos EUA, existem centenas de grupos. Na França,
começaram em 2001 e hoje há mais de 2 mil no país, com entregas
regulares de 80 mil caixas de alimentos para cerca de 320 mil
consumidores. “No Brasil, estamos trabalhando para que esse movimento se
fortaleça.
Em menos de cinco anos, já temos 600 famílias que fazem parte da
cadeia”, afirma Hermann Pollmann, um dos fundadores da CSA Brasil,
entidade que coordena os grupos no País.
Quando ele chegou ao Brasil em 2010, vindo da Alemanha, trouxe a
ideia de criar por aqui esses grupos e fundou o primeiro em Botucatu.
Hoje, há oito grupos no País, em cidades como São Paulo (três núcleos),
Ourinhos, Bauru, Campinas e Itajubá (MG). O de Botucatu é o maior e
conta com 12 hectares para produção para 300 famílias. “A demanda por
esse tipo de relação com a produção do alimento tem sido maior do que
podemos atender”, diz Pollman, que conseguiu uma verba do Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) em janeiro
para instituir a CSA Brasil e promover o conceito por meio de cursos,
palestras e um
site da entidade.
“Queremos difundir ainda mais o conceito e mostrar que nossa relação
com a comida vai além da prateleira – envolve as pessoas que a produzem e
a terra.”
Vantagens: ter total controle da procedência e
frescor do alimento. Como os produtores fazem parte do grupo, as
relações são mais pessoais.
Desvantagem: exige total envolvimento do consumidor.
Preço: R$ 70 a cota mensal (R$ 58 vão para os
produtores e R$ 12 para administração do grupo), que inclui 1 litro de
leite, 1 queijo, 200g de manteiga, verduras, legumes e hortaliças. É
possível comprar mais de uma cota.
Onde: CSA Brasil tem a lista de grupos existentes (há três núcleos em São Paulo) e informações sobre como fundar um grupo no
csabrasil.org.
QUANTO CUSTA
Escolheu qual é o seu perfil de consumidor orgânico? Veja quanto você vai pagar pelo quilo da batata
Supermercado: R$ 10,65
Cesta: R$ 8
Feira d’A Queijaria: R$ 7
Feira da Água Branca: R$ 6
GCR: R$ 5,35
CSA: R$ 5,10*
Batata convencional no supermercado: R$ 4
*O preço é estimado, pois no início do ano o produtor apresenta para
seus “sócios” os custos totais de produção, que são divididos entre
todos e projetados no valor pago mensalmente nas cestas. Os preços não
estão sujeitos a variações de mercado, já que o produtor não vende no
comércio.